sexta-feira, 28 de abril de 2006

Mais e mais...



Se nos faz bem, acaba por ser útil. Mais uma então.

...e a felicidade real presente na "verdade" cruel.


Verdade

A porta da verdade estava aberta,
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.

Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade voltava
igualmente com meio perfil.

E os meios perfis não coincidiam.

Arrebentaram a porta.
Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso onde a verdade
esplendia seus fogos.
Era dividida em metades diferentes uma da outra.
Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar.

Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.

Carlos Drummond de Andrade

terça-feira, 25 de abril de 2006

Por um dedo de prosa


Nada mais propício para uma postagem longa do que a fala comprobatória da própria falta do que falar.
Ninguém mais propício do que C. D. A. para assumir essa incumbência. Lê-lo outra e outra vez e novamente emocionar-se...

Hoje não escrevo

Chega um dia de falta de assunto. Ou, mais propriamente, de falta de apetite para os milhares de assuntos.
Escrever é triste. Impede a conjugação de tantos outros verbos. Os dedos sobre o teclado, as letras se reunindo com maior ou menor velocidade, mas com igual indiferença pelo que vão dizendo, enquanto lá fora a vida estoura não só em bombas como também em dádivas de toda natureza, inclusive a simples claridade da hora, vedada a você, que está de olho na maquininha. O mundo deixa de ser realidade quente para se reduzir a marginália, purê de palavras, reflexos no espelo (infiel) do dicionário.
O que você perde em viver, escrevinhando sobre a vida. Não apenas o sol, mas tudo que ele ilumina. Tudo que se faz sem você, porque com você não é posspivel contar. Você esperando que os outros vivam para depois comentá-los com a maior cara-de-pau (“com isenção de largo espectro”, como diria a bula, se seus escritos fossem produtos medicinais). Selecionando os retalhos de vida dos outros, para objeto de sua divagação descompromissada. Sereno. Superior. Divino. Sim, como se fosse deus, rei proprietário do universo, que escolhe para o seu jantar de notícias um terremoto, uma revolução, um adultério grego - à vezes nem isso, porque no painel imenso você escolhe só um besouro em campanha para verrumar a madeira. Sim, senhor, que importância a sua: sentado aí, camisa berta, sandálias, ar condicionado, cafezinho, dando sua opinião sobre a angústia, a revolta, o ridículo, a maluquice dos homens. Esquecido de que é um deles.
Ah, você participa com palavras? Sua escrita - por hipótese - transforma a cara das coisas, há capítulos da História devidos à sua maneira de ajuntar substantivos, adjetivos, verbos? Mas foram os outros, crédulos, sugestionáveis, que fizeram o acontecimento. Isso de escrever O Capital é uma coisa, derrubar as estruturas, na raça, é outra. E nem sequer você escreveu O Capital. Não é todos os dias que se mete uma idéia na cabeça do próximo, por via gramatical. E a regra situa no mesmo saco escrever e abster-se. Vazio, antes e depois da operação.
Claro, você aprovou as valentes ações dos outros, sem se dar ao incômodo de pratocá-las. Desaprovou as ações nefandas, e dispensou-se de corrigir-lhe os efeitos. Assim é fácil manter a consciência limpa. Eu queria ver sua consciência faiscando de limpeza é na ação, que costuma sujar os dedos e mais alguma coisa. Ao passo que, em sua protegida pessoa, eles apenas se tisnam quando é hora de mudar a fita no carretel.
E então vem o tédio. De Senhor dos Assuntos, passar a espectador enfastiado de espetáculo. Tantos fatos simultâneos e entrechocantes, o absurdo promovido a regra de jogo, excesso de vibração, dificuldade em abranger a cena com o simples par de olhos e uma fatigada atenção. Tudo se repete na linha do imprevisto, pois ao imprevisto sucede outro, num mecanismo de monotonia... explosiva. Na hora ingrata de escrever, como optar entre as variedades de insólito? E que dizer, que não seja invalidado pelo acontecimento de logo mais, ou de agora mesmo? Que sentir ou ruminar, se não nos concedem tempo para isso entre dois acontecimentos que desabam como meteoritos sobre a mesa? Nem sequer você pode lamentar-se pela incomodidade profissional. Não é redator de boletim político, não é comentarista internacional, colunista especializado, não precisa esgotar os temas, ver mais longe do que o comum, manter-se afiado como a boa peixeira pernambucana. Você é o marginal ameno, sem responsabilidade na instrução ou orientação do público, não há razão para aborrecer-se com os fatos e a leve obrigação de confeitá-los ou temperá-los à sua maneira. Que é isso, rapaz. Entretanto, aí está você, casmurro e indisposto para a tarefa de encher o papel de sinaizinhos pretos. Concluiu que não há assunto, quer dizer: que não há para você, porque ao assunto deve corresponder certo número de sinaizinhos, e você não sabe ir além disso, não corta de verdade a barriga da vida, não revolve os intestinos da vida, fica em sua cadeira, assuntando, assuntando...
Então hoje não tem crônica.
Carlos Drummond de Andrade.

domingo, 23 de abril de 2006

Tudo pelos ares...


Eu não tenho nem um tipo de fanatismo por presidentes loucos, mas tenho me sentido quase obrigado a fazer essas últimas postagens no manual. Hoje eu resolvi trazer um outro maluco (e esse é maluco mesmo!) que comanda o Irã, um dos países mais problemáticos do Oriente.
Mahmoud Ahmadinejad, eleito na última eleição presidencial do país, é no mínimo um cara corajoso. Entretido em projetos de aperfeiçoamento das usinas que produzem combustível nuclear, o cara já declarou aos EUA que o Irã não tem o menor propósito de limitar o projeto a experiências que não incluam urânio (ingrediente principal na fabricação de bombas nucleares).
É claro que isso gera uma preocupação global por ser algo realmente sério, mas o lado bom de tudo isso é saber que mais uma vez G. W. Bush vai molhar as calças de medo. Se existe alguém que pode ser usado como cobaia para o experimento de uma B.A., esse alguém são os EUA.
É incrível ver países de economia tão pequena usufruindo de tão alta tecnologia - pena que mais uma vez usando-a para o mal.
Eu fico pensando: enquanto inspetores internacionais de agências de segurança mundial, como a AIEA, a ONU e mais um renca de zeladores da paz estão passando noites em claro tentando descobrir um forma de deter esses extremistas que surgem de tempo em tempo, o próprio Bush e o Ahmadinejad devem estar na privada, cagando e pensando o que fazer pra destruir mais rápido um ao outro.
Nós somos só telespectadores. Vítimas, mas telespectadores.

quinta-feira, 20 de abril de 2006

"Carreira" de sucesso


O rapaz simpático aí do lado é ninguém menos do que o homem que quer fazer da Bolívia o maior fornecedor de matéria prima para fabricação de cocaína no planeta. Juan Evo Morales Ayma é seu nome. Morales é o atual presidente do país e líder do movimento esquerdista boliviano cocalero, uma federação de agricultores que tem por tradição o cultivo de coca para atender um costume milenar da nação que é mascar folhas de coca. De origem ameríndia, da etnia aymará, o cara é um dos indígenas mais famosos da história da Bolívia.

Fã declarado de Fidel Castro, pelo fato do cara ser figura evidente na oposição à política norte-america, Morales não poupa argumentos em seus discursos e propõe que o problema da cocaína seja resolvido do lado do consumo.

É claro que o cara está mais que certo.

Primeiro porque o patrimônio cultural dos povos andinos (e de qualquer outro povo) é parte inseparável da cultura boliviana e não uma simples regulação de uma convenção estrangeira, e segundo porque por mais que a Bolívia possa se tornar uma potência mundial cultivando papoula (e essa possibilidade faz G. W. Bush se mijar de medo) não é direito de país algum definir as regras a serem seguidas por todos os homens.

Cocaína é uma droga ilícita, viciante e prejudicial à saúde, certo? mas coca-cola também é uma droga, viciante e prejudicial à saúde. A diferença é que coca-cola é lícita. Merda!

terça-feira, 18 de abril de 2006

Apocalypse Please!



Ontem se completaram 10 anos desde o massacre de Eldorado dos Carajás. Todos os jornais mostraram as manifestações do MST criticando o comportamento dos militantes que mais uma vez protestaram e até saquearam caminhões num protesto por rodovias em nove estados do Brasil. Eu tenho apenas uma pergunta: será que a imprensa esperava que eles se reunissem, se abraçassem e cantassem músicas em homenagem aos companheiros assassinados?

O MST reivindicou um novo julgamento para 142 soldados, cabos e sargentos absolvidos pelo Tribunal do Júri em dezembro de 2004. Já o coronel Mário Pantoja, condenado a 228 anos, e o major José Maria Oliveira, condenado a 158 anos, respondem em liberdade concedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) ao recurso contra a condenação.

O fato é tão sério e evidente que há pessoas do mundo todo protestando. Um grupo de entidades de defesa de direitos humanos e ligadas à América Latina promoveu nesta segunda-feira em Washington uma passeata para lembrar os dez anos do massacre. No Brasil todos viram mais uma vez, pelos arquivos dos telejornais, as cenas da luta armada. Novamente todos agiram com a mesma indiferença, como se o incidente tivesse acontecido ontem.

O que revolta é saber que todos os dias surgem sindicatos e movimentos novos, com militantes novos com problemas novos para serem resolvidos, mas o problema da reforma agrária que é muito maior, mais velho e consequentemente mais importante do que qualquer um desses, ainda está por resolver.

É duro ter que enxergar a impunidade gritante presente nesse acontecimento, mas nós estamos num país onde o Ministro da Justiça está sendo investigado por suspeita de envolvimento em crime de quebra de sigilo bancário ao mesmo tempo em que a Kelly Key ganha um disco de ouro no Domingão do Faustão. Nessas horas em que as aberrações surgem todas de uma vez eu penso que quando o fim do mundo chegar, o Brasil vai ser um dos primeiros a ir pelos ares.

O que vai nos exterminar primeiro? A guerra ou a mediocridade?

segunda-feira, 17 de abril de 2006

Fala


Olá meus caros!
Recebi nessa Páscoa recém findada várias manifestações a respeito do manual por parte de meus (fiéis) leitores. Uns me disseram sobre a necessidade de alimentar esse blog, outros protestaram. Pediram que eu guardasse para mim minha filosofia.

O fato é que a liberdade de expressão ainda é o maior tesouro que um cidadão brasileiro pode ter, convenhamos. Se eu privar o mundo de conhecer meus pensamentos não vou me sentir satisfeito.

O desabafo vale mesmo pelo desabafo. E enquanto isso os cães ladram.

quarta-feira, 5 de abril de 2006

Retrocesso


Opa!
Já havia um tempo que eu não dava as caras por aqui. Acho que por carecer cada vez mais de tempo, tive receio de escrever qualquer merda e comprometer a qualidade do conteúdo do manual. Percebi que era bobagem essa preocupação porque primeiro: ninguém (ou quase ninguém) lê o que eu escrevo, e segundo: qualquer um que passe por aqui não tem paciência para ler o texto até o final.
Um amigo me disse que eu deveria trabalhar mais com imagens e menos com palavras, pois isso faria o conteúdo do blog ser mais convidativo. Então eu expliquei que a intenção era justamente o contrário: usar apenas uma figurinha e deixar toda idéia a ser transmitida pela postagem reservada para para o texto, que também resolvi publicar usando "courier", uma fonte feia que camufla a beleza das palavras.
Hoje mesmo eu iria deixar uma postagem sobre um cara na china que estava vendendo terrenos na Lua, e o pior: tinha muita gente comprando...mas aí eu fiquei revoltado com umas coisas que aconteceram aqui e resolvi deixar pra outro dia...